Madeira: Aborto, Democracia e Estado de Direito.

"O que se passa na Madeira acerca da recusa das autoridades regionais em cumprir uma lei da República é a todos os títulos inaceitável, sendo ilustrativo da qualidade da «democracia» que se vive naquela Região Autónoma. É que nisto da democracia e do Estado de Direito os votos são essenciais, mas não são suficientes. O poder regional tem evidentemente legitimidade para legislar e fazer opções nas matérias próprias da autonomia regional; mas não a tem para impedir a vigência na região de uma lei geral República, atributiva de direitos a todos os cidadãos nacionais.
Os órgãos de governo próprio das regiões têm, nos termos da lei, legitimidade para suscitar a fiscalização sucessiva da constitucionalidade das leis da República, mas o recurso ao Tribunal Constitucional para esse efeito não tem efeito suspensivo da lei em causa. Tudo isso bem sabem os caciques madeirenses que ilegitimamente se têm oposto ao cumprimento da legalidade. Acresce que não só a razão alegada é uma falsa razão, como a própria razão é falsa. Isto é: não só o pedido de fiscalização sucessiva da constitucionalidade da lei não permite suspender a lei na Região; como, ao contrário do que foi dito, nenhum pedido as autoridades regionais apresentaram ao Tribunal Constitucional nessa matéria (disse-o ontem com todas as letras o presidente do Tribunal Constitucional).
Enquanto problema de legalidade, as questões que em decorrência desta atitude irresponsável se vierem a suscitar, darão lugar à responsabilidade civil da Região, senão mesmo do Estado. Mas isso, que ontem o senhor Presidente da República bem referiu, é pouco. O problema é bem mais fundo, é um problema político de melindre, que desde há muito urge enfrentar. Hitler também chegou ao poder por via dos votos; mas isso não deveria ter impedido a sua destituição, ainda que pela força, logo que se soube ao que vinha. Ora, da camarilha que leva curtas as rédeas da Madeira, só se pode esperar a continuação da actividade desrespeitosa das regras do Estado de Direito. E compactuar com isso é ser co-responsável."

J.F. Moreira das Neves, Juiz de Direito.

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